18 junho 2013

Leitos de UTI com janela não melhoram o prognóstico

Kohn et al, "Do windows or natural views affect outcomes or costs among patients in ICUs ?" Crit Care Med 2013;41:1645-55.

Retorno ao batente com um artigo que logo me chamou a atenção na última edição da revista Crit Care Medicine deste mês. Esta é a principal revista da nossa área e publica, teoricamente, os melhores artigos. Mas como ocorre sempre, há exceção para toda regra.

Um grupo da universidade da Pensilvania estudaram se a presença de janelas no sleitos de UTI poderiam melhorar o prognóstico dos pacientes. Sabe-se hoje que os novos hospitais americanos são obrigados a construir leitos com janelas e luz natural. Mas o benefício desta medida pode ser questionável.

Duas UTIs desta universidade - a clínica e a cirúrgica - foram avaliadas. E o problema começa aí: as UTIs são completamente diferentes. A UTI clínica tem 17 leitos: 4 têm janelas com vista natural, 6 têm janelas com visões do céu e 7 têm visão "industrial" (ou seja, prédios). Mas 7 leitos desta UTI não têm janelas. Já a UTI cirúrgica têm 11 leitos com janelas com visão natural e outras 13 com visão industrial. Como é que eles podem uniformizar a informação com estas 2 estruturas ? Fazendo múltiplas classificações e categorizações (às vezes de maneira esquizofrênica).

No fim das contas, eles classificaram vista de janela como aquelas com visão da natureza. Assim, escolheram os desfechos de mortalidade, tempo de permanência e delirium para avaliar. Fiquei animado com a questão de delirium, mas eles não aplicaram nenhum questionário específico, e 1 pesquisador revisou parte dos mais de 7000 prontuários para saber se houve evidência de delirium (distúrbio de atenção, alucinações, alteração da consciência, desorientação, confusão, etc). Fizeram ainda uma classificação se o paciente houvesse trocado de leito sem janela/vista para outro com vista e vice-versa.

As conclusões foram decepcionantes. Primeiramente, não houve mudança nos desfechos escolhidos de acordo com janela/vista. Também não houve mudança nos custos dos pacientes. Mas houve 1 exceção: o subgrupo de pacientes clínicos com mais de 72 h de permanência na UTI: a mortalidade na UTI e hospitalar foram cerca de 20% menores (p=0,02 e 0,04, respectivamente). Este resultado pelo menos não nos desanima totalmente.

Há tantas limitações ao artigo, que eu não sei como conseguiu a publicação. Aponto as mais contundentes: não se verificou se os leitos dos pacientes ficaram virados para as janelas. E incluiu-se pacientes sedados, cegos e com dano cerebral ! Outro ponto muito criticado: apenas 3% de delirium em pacientes cirúrgicos (ou eram cirurgias menores ou não se diagnosticou de maneira correta). Finalmente, não se verificou a satisfação de pacientes e familiares em relação aos leitos com e sem janelas (que obviamente não precisa nem perguntar).

Conclusões ? Nenhuma. Tirei 2 suposições desta estória: primeiro, se eu precisar, me internem em leito com janela se possível; segundo, parem com a afirmativa que delirium é só por causa de confinamento na UTI.

André Japiassú

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