01 novembro 2008

SEÇÃO DE ENFERMAGEM: É SIM UMA QUESTÃO DE VALOR

A discussão sobre a crise financeira mundial ganhou espaço nos jornais, tele-jornais, rádio, internet, enfim na mídia e ultimamente faz parte de nosso cotidiano. O sobe-e-desce das Bolsas de Valores, a incerteza no mercado, as grandes perdas de capital, para especialistas, podem ter efeitos graves sobre a sociedade, que vão desde o agravamento de sinais de depressão e de distúrbios mentais até a doenças mais graves.

Para entendermos um pouco a crise, trago algumas questões e dados poucos conhecidos por nós, que vivemos, lemos e respiramos artigos científicos. Como funciona o Mercado Financeiro? Os maiores bancos centrais do mundo, utilizam seus recursos para prestar socorro aos mercados financeiros. Em seis ocasiões, entre os anos 90 e 2000, muitos bilhões de dólares, foram gastos para estancar as crises. Com a crise mexicana de 1994, gastou-se 47 bilhões. Em 2007, a chamada crise do subprime, ou seja, a crise no setor imobiliário americano colocou os mercados em pânico. Com isso, os bancos centrais dos Estados Unidos, União Européia, Japão e Austrália, entraram em ação com 420 bilhões, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Na revista Exame de 29 de agosto de 2007, há uma entrevista com o maior filósofo mundial do risco, Peter Bernstein. Sobre as lições que esta crise nos oferece, Bernstein ressalta: "a maioria das crises financeiras – ou talvez todas elas desenvolveu-se a partir de uma situação em que 99% das pessoas não tinham informação. É aí que fica perigoso – quando ninguém desconfia de que algo pode estar errado. Precisamos prestar atenção nos sinais da economia e julgar isso. Na crise atual, correr grandes riscos virou quase motivo de orgulho. Investir em empréstimos subprime não é diversificar riscos. É ter milhares de créditos podres. Mas havia a sensação de que as inovações do sistema financeiro resolveriam todos os problemas. Não vamos ter outra crise dessas por algum tempo, porque a lição será aprendida. Mas pode levar tempo para o sistema se regenerar."

Então nos perguntamos: mas o que isto tem a ver com minha rotina, meu serviço, ou com a terapia intensiva? Em nosso primeiro encontro neste BLOG falamos sobre qualidade de vida, olha aí, o comprometimento de um quesito fundamental para a saúde do profissional da saúde.

A crise financeira afetando a qualidade de vida de cada um de nós! Muito mais que uma crise econômica, o sobe-e-desce das bolsas pelo mundo, incertezas, perdas e instabilidade no mercado interno e externo, tem causado uma verdadeira avalanche na vida de muitas pessoas. Mais do que dinheiro, os americanos, principalmente, estão perdendo a tranqüilidade e em alguns casos, a estabilidade financeira.

Todas estas dúvidas e perdas têm causado um aumento considerável no número de pessoas que procuram os centros de saúde, disse um funcionário do órgão de saúde americano em uma entrevista a rede de televisão americana CNN. As pessoas estão muito ansiosas e isso afeta toda a família, tornando-os mais agressivos. Ainda nesta entrevista, foi mostrado que nos institutos de saúde, um dos grande problemas estão relacionados ao sono, poucos conseguem dormir poucas horas durante a noite.

Logo, o estilo de vida faz com que os americanos tenham um foco sempre na conquista, financeira, principalmente, e quando começam a perder confiança, se tornam mais vulneráveis, a imunidade fica baixa, e a saúde passa a ser prejudicada. Olha aí imunidade baixa, pessoas mais suceptíveis as doenças. Será que isso não tem a ver conosco ? Somos cuidadores e zelamos pelo cuidar !

Em outra entrevista, a professora de Psiquiatria Clínica na Universidade da Califórnia em San Diego, Judith Bardwick, avaliou que a enxurrada de manchetes nos jornais descrevendo o declínio da economia americana exacerbou sentimentos de impotência em um período de instabilidade no mercado de trabalho. "É um sentimento de medo, depressão e ansiedade, que nos diz que não importa o quão duro, ou bem, trabalhemos, não tenho controle sobre o meu futuro", explicou Judith, referindo-se a costumes arraigados no modo de vida dos americanos
de investir, graças ao crédito, em grandes casas, automóveis, viajar e consumir.

Mas não é apenas a população que está sofrendo com a crise, pela primeira vez em pelo menos uma década, o consumidor americano tenta viver com menos remédios. Ao responder à crise financeira pagando primeiro por itens necessários como comida e moradia, os americanos passaram a comprar menos remédios em todo o país.

O Dr. James King, Presidente da Academia Americana de Médicos de Família afirma: "As pessoas agora têm que escolher entre o gás, a comida e os remédios", disse. "Alguns pacientes me disseram que pararam de tomar o Lipitor® porque simplesmente não têm dinheiro para comprá-lo", Ao longo de agosto, o número de remédios vendidos nos Estados Unidos foi menor do que nos primeiros oito meses do ano passado, de acordo com uma análise recente do IMS Health, empresa de pesquisa que acompanha a venda de medicamentos.

No início do mês de outubro, a gigante farmacêutica Pfizer, fabricante do Lipitor, o remédio mais vendido do mundo, disse que a venda do medicamento nos Estados Unidos caiu 13% no terceiro quadrimestre do ano. Apesar de outros motivos também estarem presentes, como a preocupação em relação à segurança de remédios antes populares e a mudança de alguns medicamentos que passaram a exigir receita, muitos médicos e outros especialistas dizem que a dificuldade financeira é o maior motivo da queda nas vendas.

A tendência, caso continue, pode ter efeitos profundos. Caso muitas pessoas tentem economizar evitando a compra de remédios, situações antes controláveis podem se tornar enormes problemas de saúde. Eventualmente isso pode aumentar a conta da saúde pública e diminuir o padrão de vida do país. Apesar do declínio na compra de remédios não passar de 1%, de acordo com dados do IMS Health, essa é a primeira queda em mais de uma década de crescimento constante, impulsionado pelo envelhecimento da população e a chegada de novos remédios. Esse fato é justificado pelo Dr. Timothy Anderson, analista farmacêutico da Sanford C. Bernstein que teve acesso aos dados do IMS e foi o primeiro a anunciar a queda na venda dos remédios na semana passada, afirmou que a queda no volume está “ligada a uma piora no ambiente econômico".

Jack Hoadley, analista de políticas médicas da Universidade de Georgetown, afirmou: "Eles irão dividir as pílulas, tomá-las dia sim, dia não, e farão muitas outras coisas sem consultar seus médicos. Nós conversamos com vários setores da sociedade. Eles olham para seus remédios e dizem: 'Esse é um que eu não preciso realmente'. Eles não deixarão de tomar remédios contra a dor, porque irão se sentir mal.Mas deixarão de tomar os medicamentos contra o colesterol porque não sentem seu efeito".

A possibilidade do aumento de enfermidades, entre elas o suicídio já preocupa a Organização Mundial de Saúde (OMS), que lançou uma nota recentemente (outubro) durante uma reunião com especialistas, em Genebra, na Suíça. A diretora-geral da OMS, Margaret Chan, disse que “não devemos nos surpreender ou menosprezar as perturbações e as possíveis conseqüências da crise financeira”.

Já existem estatísticas que comprovam que há um aumento de suicídio em momentos de crise econômica. Durante a Grande Depressão em 1929 (quebra da Bolsa de Nova York) houve um aumento de suicídio. No Brasil, durante o Plano Collor, que confiscou a poupança, também houve um aumento de suicídio”.

Por falar em Brasil, aqui não estamos nem um pouco longe de entrar em uma fase parecida, o problema é que o nosso sistema de saúde ainda é falho, trata apenas o sintoma aparente, isso quando consegue ter acesso a algum tratamento, apesar de sabermos que quem necessita do sistema de saúde geralmente não tem grandes somas financeiras aplicadas, mas de uma forma ou de outra sempre acaba afetando as condições econômicas e conseqüentemente emocionais da população.

Sendo assim, as mudanças afetam não somente a enfermagem, mas todos nós que trabalhamos com a saúde (ou falta dela), por isso é importante conhecermos os processos, o cuidar deve ser visto como um modelo produtivo, que devem ser revistos e reformulados. Os novos processos e tecnologias causam a dispensa de mão de obra direta e indireta, mas com forte aumento de produtividade. Com isso, o desemprego cresce incontrolavelmente acompanhado pela crise, o que nos leva a refletir que precisamos de mão de obra escolarizada, com iniciativa, autonomia e competência para fazer frente a estas mudanças. Pois novas habilidades são exigidas: flexibilidade, capacidade de negociação, compreensão da atividade produtiva e do ambiente de trabalho. A boa capacidade de comunicação, trabalho em equipe, tomada de decisões, disposição para mudanças, o autodesenvolvimento, a aprendizagem permanente, criatividade, autonomia e mais outras tantas competências devem estar imbuídos no profissional globalizado, não só para a melhoria dos cuidados prestados, mas para a “guerra” no mercado de trabalho.

Certamente, as políticas de saúde no Brasil caracterizam-se pelo vínculo estreito com as políticas de Previdência Social, sobretudo no que diz respeito à forma de financiamento, havendo instâncias responsáveis por excelência pela saúde: O Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.

Por isso, recuperar a trajetória das políticas de saúde e da conformação do sistema de saúde demanda destaque para as principais características nos diferentes momentos históricos. Nos tempos de crise, o melhor é manter a calma, manter-se informado, favorecer o corpo e a mente (o que geralmente cuidamos apenas do outro), e isso sim, é uma questão de valor!


Enf Renata Andréa Pietro P. Viana
Presidente do Departamento de Enfermagem AMIB
Chefe do Serviço de Terapia Intensiva HSPE - São Paulo - SP






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