09 julho 2007

Uso de Hidrocortisona na Pneumonia Comunitária Grave: um Estudo Preliminar Randomizado

Uso de Hidrocortisona na Pneumonia
Comunitária Grave: um Estudo Preliminar
Randomizado

Hydrocortisone infusion for severe community-acquired
pneumonia a preliminary randomized study.
“Am J Respir Crit Care Med” 2005;171:242-248.
Confalonieri M, Urbino R, Potena A “et al.”

RESUMO
Este estudo testou a hipótese de que a infusão de hidrocortisona
em pacientes com pneumonia comunitária grave atenua a inflamação
sistêmica e leva à resolução precoce da pneumonia e à redução das
complicações relacionadas à sepse. Em um estudo multicêntrico, pacientes
admitidos na UTI com pneumonia comunitária grave receberam
terapia antimicrobiana padronizada e foram randomicamente alocados
em dois grupos: hidrocortisona ou placebo. A hidrocortisona foi administrada
em bolus de 200 mg IV seguida de infusão de 10 mg/hora por
sete dias. Os desfechos primários foram amelhora da relação PaO2/FIO2
(> 300 ou 100 em relação à entrada no estudo) e escore de disfunção
MODS (multiple organ dysfuntion score) no oitavo dia, além da redução de
choque séptico tardio. Quarenta e seis pacientes foram incluídos. Ao
início do estudo, os pacientes que receberam hidrocortisona tinham
menor relação PaO2/FIO2, maior escore radiológico e níveis mais elevados
de proteína C reativa. No oitavo dia do estudo, pacientes tratados
com hidrocortisona obtiveram significativa melhora quando comparados
aos controles, nos seguintes parâmetros: PaO2/FIO2 (p = 0,002),
escore radiológico (p<0,0001), proteína C reativa (p=0,01),MODS (p
=0,003) e choque séptico tardio (p=0,001). O tratamento com hidrocortisona
esteve associado a significativa redução do tempo de permanência
no hospital (p = 0,003) e a menor mortalidade (p = 0,009).
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COMENTÁRIOS
Em uma recente publicação, Confalonieri et al. relataram os efeitos
do uso de hidrocortisona em pacientes com pneumonia comunitária
grave. Nesse estudo preliminar os autores relataram haver redução da
mortalidade, melhora da oxigenação, redução dos escores radiológicos
e de disfunção orgânica, além de redução dos níveis de marcadores
pró-inflamatórios (PCR) em pacientes recebendo hidrocortisona quando
comparados ao grupo controle. Embora a questão acerca do uso de
esteróides como tratamento adjunto das pneumonias não seja nova,
tendo sido inicialmente proposto há mais de 60 anos, seus benefícios
nunca foram demonstrados inequivocamente em um ensaio clínico
controlado.1 Justificam-se os benefícios do uso de esteróides com base
em seu potencial de imunomodulação que poderia impedir, ou retardar,
a evolução da lesão pulmonar aguda e das demais disfunções orgânicas.
Contudo, os argumentos dos autores não se baseiam em
acompanhamento evolutivo de biomarcadores classicamente associados
à inflamação sistêmica e à presença e gravidade de lesão pulmonar
aguda, tais como IL-6 e IL-8. Merece ainda destaque o fato de a função
adrenal não ter sido avaliada nessa população de pacientes.
Estudos recentes demonstraram melhora da sobrevida,2,3 disfunções
orgânicas2,4 e mediadores pró-inflamatórios de pacientes com
sepse grave e diagnóstico de insuficiência adrenal tratados com hidrocortisona.
5 Um aspecto comum aos pacientes incluídos nos estudos
citados é a elevada prevalência de pneumonia (35%-50%) como causa de
sepse grave. Tal aspecto assume ainda maior relevância ao observarmos
que Confalonieri et al. descrevem menor freqüência de choque
séptico tardio em pacientes tratados com hidrocortisona. Ao analisarmos
os estudos que descrevem o uso de corticosteróides na sepse,
seus resultados são variáveis no que diz respeito a imunomodulação,
sobrevida, reversão de disfunção, mas todos demonstram redução da
necessidade de vasopressores significativa.6
A elevada prevalência de pneumonia como fonte da infecção dos
pacientes com sepse grave envolvidos nos ensaios clínicos de uso de
corticosteróides na sepse nos remete aos mecanismos envolvidos na
resposta aos corticosteróides. Pode-se assim especular que o estudo de
Confalonieri et al. tenha demonstrado não só os benefícios da imunomodulação
através da infusão de hidrocortisona, mas também os do
tratamento da insuficiência adrenal em pacientes críticos com sepse de
etiologia pulmonar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Perla D, Marmorston J. Suprarenal cortical hormone and salt in the
treatment of pneumonia and other severe infections. Endocrinology
1940;27:367-374.
2. Annane D, Sebille V, Charpentier C et al. Effect of treatment with low
doses of hydrocortisone and fludrocortisone on mortality in patients with
septic shock. JAMA 2002;288:862-871.
3. Bollaert PE, Charpentier C, Levy B, Debouverie M, Audibert G, Larcan
A. Reversal of late septic shock with supraphysiologic doses of
hydrocortisone. Crit Care Med 1998;26:645-650.
4. Briegel J, Forst H, Haller M et al. Stress doses of hydrocortisone reverse
hyperdynamic septic shock: a prospective, randomized, double-blind,
single-center study. Crit Care Med 1999;27:723-732.
5. Keh D, Boehnke T, Weber-Cartens S et al. Immunologic and
hemodynamic effects of “low-dose” hydrocortisone in septic shock: a
double-blind, randomized, placebo-controlled, crossover study. Am J
Respir Crit Care Med 2003;167:512-520.
6. Annane D, Bellissant E, Bollaert PE, Briegel J, Keh D, Kupfer Y.
Corticosteroids for severe sepsis and septic shock: a systematic review
and meta-analysis. BMJ 2004;329:480-488.

Por Jorge Salluh

Do Volume III de ATUALIZAÇÃO EM MEDICINA INTENSIVA – ARTIGOS COMENTADOS

Disponível em www.revinter.com.br , www.submarino.com.br

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