A empresa Lilly anunciou a retirada do medicamento Xigris (proteína C ativada) do mercado mundial. Se alguém quiser usar o medicamento, não o encontrará mais para comprar. Leia no site: http://www.rcmpharma.com/actualidade/medicamentos/27-10-11/eli-lilly-retira-xigris-de-todos-os-mercados-mundiais.
A novela do Xigris durou 10 anos. Em 2001, saiu o PROWESS, estudo clínico na New England Journal of Medicine (maior revista médica do mundo), mostrando que havia redução de mortalidade de 6% no subgrupo de pacientes mais graves (APACHE II > 25 pontos). Este resultado foi o suficiente para lançar no mercado a medicação, que custava aproximadamente R$ 40 a 50 mil na época. Chegou-se a dizer que seria anti-ético não usá-lo no paciente séptico grave, em meados de 2003-2004. A Campanha Surviving Sepsis Campaign, de 2004, indicava seu uso, com bom grau de evidência (B).
A partir de 2004, com a publicação de 2 estudos com pacientes sépticos menos graves, pairaram as primeiras dúvidas sobre a medicação. Não houve benefício, enquanto os pacientes apresentavam o dobro de chance de sangramento. Outros estudos com uso off-label na Itália e no Canadá também levantaram dúvidas sobre o real benefício do Xigris.
Acontece que os efeitos clínicos são discretos, como melhora de disfunções orgânicas, e têm base em estudos experimentais (que foram publicados após a liberação de uso clínico). Pode ser que algum subgrupo de pacientes com sepse possa ter algum benefício, mas isto não ficou claro nos estudos clínicos. Por último, muitos pesquisadores que publicaram estes estudos foram patrocinados pela empresa, e tinham obviamente conflitos de interesse.
O ultimato para retirar a droga foi o estudo PROWESS-SHOCK (ainda não publicado), no qual tentou-se reproduzir os resultados do PROWESS, em pacientes com choque e mais 1 disfunção orgânica; não houve redução de mortalidade em 28 dias.
Recentemente, na semana passada, participei de uma mesa sobre terapias na sepse no Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva (Porto Alegre), na qual participaram alguns experts na área. Foram várias palestras bacanas sobre uso de fluidos, aminas, nutrição e monitorização metabólica. No fim, perguntei o que seria importante focar na próxima década, se quase todas as terapias falharam na década de 2000. Só JL Vincent não fugiu da raia e respondeu: "Fizemos tudo errado até agora sobre tratamento da sepse; temos que abordá-la de forma totalmente diferente a partir de agora, talvez minuciando subgrupos de pacientes, ou focando em educação nesta área". Fica a dica do craque.
André Japiassú
Este blog tem como objetivo trazer informações e visões críticas sobre os estudos científicos recentes em medicina hospitalar e terapia intensiva. Também no Instagram: artigoscomentadosemmedicina
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Vincent chamou a atenção que a próxima fronteira deve ser a avaliação na permeabilidade endotelial.
ResponderEliminarSim, Alan
ResponderEliminarO Arthur Slutsky também ressaltou isto na sua conferência.
Mas, na verdade, a abordagem deve ser muito mais ampla que simplesmente atacar 1 dos fatores responsáveis pela sepse.
Acho que o grande passo é a educação dos profisisonais e do povo, sobre o que é e reconhecer sepse.