23 agosto 2014

ENFERMAGEM: QUALIDADE DE VIDA

Século XXI, estamos no terceiro milênio e vivemos um momento de efervescência tecnológica e constatação de que a tecnologia não dá conta das necessidades do ser humano. Percebemos diariamente, em nosso cotidiano, novas formas de monitorização e monitoração na terapia intensiva, sempre em busca do melhor e mais adequado suporte ao paciente grave. Mas nunca nos perguntamos se toda esta tecnologia propicia qualidade de vida aos profissionais da saúde. Como é a qualidade de vida de quem cuida de vidas? Pesquisas e estudos sobre qualidade de vida tem crescido significativamente nos últimos anos, mostrando a preocupação em suprir o que o avanço tecnológico não foi capaz de fazer. Muitos termos são usados na literatura como sinônimos de qualidade de vida, tais como: bem-estar, felicidade, boas condições de vida e satisfação na vida. Um estudo realizada por Walcker & Avant relacionou os atributos incluídos quando o conceito de qualidade de vida é descrito ou definido. Os autores relatam que uma boa qualidade de vida permite ao profissional: a) avaliar um sentimento de satisfação com a própria vida em geral; b) desenvolver a capacidade mental de avaliar sua própria vida como satisfatória; c) garantir um estado aceitável de saúde física, emocional, mental e social; d) realizar uma avaliação objetiva, feita por outro profissional, garantindo que as condições de vida da pessoa são adequadas e não ameaçadoras à vida.
A qualidade de vida está intimamente ligada as elevadas taxas de absenteísmo que permeiam a enfermagem brasileira. O trabalho excessivo, os plantões estressantes e a baixa remuneração, levam as altas taxas de licenças médicas. Quantos profissionais temos hoje em nossa equipe afastados com diagnóstico médico de depressão, síndrome do pânico e estresse? Escalas reduzidas, que acabam desgastando ainda mais os poucos que restam na equipe. Não pensem que a taxa de absenteísmo é elevada apenas nos serviços públicos. O serviço privado também sofre com a falta dos profissionais que muitas vezes tem em sua historia uma qualidade de vida inadequada.
A qualidade de vida é uma dimensão complexa para ser definida e sua conceituação, ponderação e valorização vêm sofrendo uma evolução, que por certo acompanha a dinâmica da humanidade, suas diferentes culturas, suas prioridades e crenças. Para Romano, qualidade de vida é mais que simplesmente a ausência ou presença de saúde, abrangendo também educação, saneamento básico, acesso a serviços de saúde, satisfação e condições de trabalho, além de outros aspectos. Alguns estudos mostram que o tipo de trabalho onde há expectativa de vida influencia na melhor qualidade de vida dos profissionais de enfermagem. Em um estudo recente, os escores mais altos, apresentados pelos profissionais de enfermagem de Unidades de Terapia Intensiva ,teriam por exemplo, relação direta com a satisfação por atuarem naquele setor. Já os escores de mais baixa qualidade de vida da equipe de enfermagem da UTI eram relativos as dimensões comoa ausência de Atividades sociais,comunitárias e cívicas e Recreação, explicadas pela característica atribuída a esses profissionais, que tem em sua rotina o trabalho estressante, somado a mais de um turno de serviço e baixa remuneração.
Quando questionados sobre o que era bem estar os enfermeiros intensivistas responderam: ter um bom emprego, incluindo salário satisfatório; conseguir um tempo para o lazer e a família, ter saúde, alimentação, moradia e vestuário. Ao nos transportarmos para o real cenário da enfermagem brasileira, percebemos que muito falta para garantirmos qualidade de vida aos nossos profissionais. Compete ao enfermeiro uma ação direcionada para o desenvolvimento de atividades cada vez mais educativas, que devem também ser priorizadas pelas intituições, fazendo-se necessária a definição de estratégias que possam oferecer suporte psicológico aos profissionais diretamente envolvidos e que mais intensamente presenciam o processo de morrer dos pacientes, principalmente, médicos, enfermeiros e toda a equipe de multiprofissional, Desse modo, pode-se dizer que a questão da qualidade de vida diz respeito ao padrão que a própria sociedade define e se mobiliza para conquistar, consciente ou inconscientemente, e ao conjunto das políticas públicas e sociais que induzem e norteiam o desenvolvimento humano, as mudanças positivas no modo, nas condições e estilos de vida, cabendo parcela significativa da formulação e das responsabilidades ao denominado setor saúde. Partindo das idéias anteriores e corroborando a afirmativa de Rameix,de que a medida da qualidade de vida no universo da saúde é irreversível,torna-se fundamental uma precaução para que sua utilidade, ao definir prioridades no racionamento de recursos, não seja confundida com a máquina de triturar oposições, com que Cevasco rotula uma das características eficazes do neoliberalismo. Por outro lado, torna-se necessário investir muito ainda no aprofundamento do conceito e da mediação de promoção da saúde, para que signifique mais do que uma idéia de senso comum, programa ideológico, imagem-objetivo e possa nortear o sentido verdadeiramente positivo de qualidade de vida aos profissionais da saúde.
Quanto aos enfermeiros, cabe a reflexão e análise do que deve ser implementado na sua prática para garantir a melhoria de sua qualidade de vida. Como diria Olga Matos, “quanto mais aprimorada a democracia, mais ampla é a noção de qualidade de vida, o grau de bem-estar da sociedade e de igual acesso a bens materiais e culturais”.
Enf. Renata Pietro
Cordenadora de Enfermagem do CTI-HSPE-SP

1 comentário:

  1. A despeito da indiscutível relevância desses profissionais em qualquer ambiente assistencial, mormente o da terapia intensiva, constitui-se numa classe massacrada pelo poder dos grandes empresários da saúde. São os únicos que, sequer, tiveram regulamentada a carga horária de trabalho, sendo explorados nos setores públicos e privados ao talante dos interesses econômicos e sem amparo legal.

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