Saúde e doença não são fenômenos isolados que possam ser definidos em si mesmos, pois estão profundamente vinculados ao contexto sócio-econômico-cultural, tanto em suas produções como na percepção do saber que investiga e propõe soluções. Com isso, o profissional da saúde não vive apenas de informações científicas, ele precisa conhecer e compreender além do processo saúde e doenca para identificar patologias cada vez mais presentes em seu dia-a-dia. Uma dessas patologias é a Síndrome de Burnout.
A Síndrome de Burnout está relacionada com o trabalho realizado pelo homem. Em uma retrospectiva comtemporânea, a palavra trabalho vem do latim "tripalium", referindo-se a um instrumento de tortura para punições dos indivíduos submetidos ao trabalho forçado. Se buscarmos além dos conceitos históricos, os conceitos religiosos mostram que o homem foi condenado ao trabalho porque Eva e Adão constituíram o pecado. O Gênesis, cita que o trabalho é considerado o castigo no qual o homem terá que trabalhar, e com o suor, conseguir o seu alimento para a sobrevivência. Em qualquer que seja o contexto, o trabalho significa necessidade e razão de vida. À medida que o indivíduo está inserido no contexto organizacional, está sujeito a diferentes variáveis que afetam diretamente o seu trabalho.
De acordo com uma pesquisa realizada pela Isma-BR (International Stress Management Association do Brasil), três em cada dez trabalhadores apresentam um quadro crônico de estresse, que caracteriza a Síndrome de Burnout. Atualmente, existe uma preocupação na saúde do indivíduo, ou seja, para que se atinja a produtividade e qualidade, é preciso ter indivíduos saudáveis e atribuídos de qualidade. Codo, Sampaio e Hitomi, afirmam que a organização do trabalho exerce, sobre o homem, uma ação específica, cujo impacto é o aparelho psíquico. Em contrapartida, a organização atua de forma onde muitas vezes pressiona-se o indivíduo, levando-o a estados de doenças, de insatisfação e desmotivação.
Será que vemos alguma semelhança nas descrições acima com as nossas rotinas e a realidade vivenciadas na Terapia intensiva? A sobrecarga de trabalho, o estresse em cuidar do paciente grave, as dificuldades em lidar com os limites entre a vida e a morte, levam-nos a inúmeros sinais e sintomas de que algo está errado, entre esses, a Síndrome de Burnout. O conceito de Burnout surgiu nos Estados Unidos em meados da década de 70, que no sentido literal significa "estar esgotado" ou "queimado", mais característico em profissões de ajuda, serviços humanos ou como Vidal (1993) afirma: "aquellas profisiones que consisten principalmente en ofrecer servicios humanos directos y de gran relevancia para el usuario". Cabe salientar que o Burnout é formado por diversos estados sucessivos que ocorrem em um tempo e representam uma forma de adaptação às fontes de estresse. Assim, o conceito surgiu para dar explicação ao processo de deterioração nos cuidados e atenção profissional nos trabalhadores de organizações. A Síndrome tem se estabelecido como uma resposta ao estresse laboral crônico integrado, por atitudes e sentimentos negativos. Não existe uma definição unânime sobre Burnout, existe um consenso em considerar que aparece no indivíduo como uma resposta ao estresse laboral. Trata-se de uma experiência subjetiva interna que agrupa sentimentos e atitudes e que tem um semblante negativo para o indivíduo, dado que implica alterações, problemas e disfunções psicofisiológicas com conseqüências nocivas para a pessoa e para a organização. Como podemos perceber, Burnout tem-se definido como uma síndrome cujos sintomas são sentimentos de esgotamento emocional, despersonalização e baixa realização pessoal no trabalho. Assim, é considerada um passo intermediário na relação estresse-conseqüências do estresse de forma que, se permanece durante um longo tempo, sob a forma de enfermidade, falta de saúde com alterações psicossomáticas (alterações cardiorespiratórias, gastrite e úlcera, dificuldade para dormir, náuseas) e para organização (deterioração do rendimento ou da qualidade de trabalho). Logo, é uma das conseqüências mais marcantes do estresse profissional, caracterizando-se pela exaustão emocional, avaliação negativa de si mesmo, depressão e insensibilidade com relação a quase tudo e todos (até como defesa emocional). Alguns pesquisadores dão dicas para identificar o Bournout:
- Só de pensar em trabalhar,você já começa a passar mal;
- Seja por falta ou excesso de competência, você se sente violentado ao realizar as atividades que lhe passam;
- Exausto o tempo todo, você está sempre a ponto de explodir ou de chorar;
- Conviver com certas pessoas do trabalho lhe incomoda demais;
- Exausto o tempo todo, você está sempre a ponto de explodir ou de chorar;
- Conviver com certas pessoas do trabalho lhe incomoda demais;
A Terapia Intensiva demanda além do contato com a vida ações diuturnas, rápidas e precisas, exigindo o máximo de eficiência de toda a equipe. Segundo Martino (2004) estudos comprovaram, que para os enfermeiros de Unidades de Terapia Intensiva, o local é muito tenso, e que isso poderia interferir no seu estado emocional, levando ao desgaste geral do organismo e, conseqüentemente, provocando estresse. Com isso, algumas pesquisas relacionando a Síndrome de Bournout com o estresse vivênciado na terapia intensiva vem despertando interesse em diversos pesquisadores. Em um estudo transversal realizado na Austrália, em UTIs neonatal, participaram 192 enfermeiros e 34 médicos, sendo demonstrado que 27% dos médicos e 32% dos enfermeiros apresentavam sintomas psicológicos semelhantes ao Bournout. Sendo que os enfermeiros apresentavam sintomas psicológicos devido ao excesso de pacientes e falta de espaço físico nas unidades. Em outro estudo Americano, Heuer et al., mostrou que 59 enfermeiros de UTI viviam em um ambiente de trabalho caótico, com número elevado de emergências e inadequação profissional. Com isso, os profissionais que trabalham em unidade de terapia intensiva, seja pela especificidade do seu trabalho ou pelo ambiente, estão expostos ao risco do estresse ocupacional e, conseqüentemente ao Burnout. A cisão entre afeto e trabalho, que nasce a partir das dimensões demarcadas pelo capital, leva-nos a considerar a Síndrome de Burnout, como uma descrição bastante familiar e presente em nosso cotidiano. A existência dessa nova enfermidade para os trabalhadores intensivistas certamente nos leva a alcançar novos horizontes e perspectivas para as possibilidades de entendimento e transformação no processo de trabalho, numa tentativa de resgatar as dimensões afetivas contidas no cotidiano de quem cuida.
Enfª Renata Andréa Pietro P. Viana
Presidente do Departamento de Enfermagem AMIB
Chefe do Serviço de Terapia Intensiva HSPE
Presidente do Departamento de Enfermagem AMIB
Chefe do Serviço de Terapia Intensiva HSPE
Excelente comentário Renata.
ResponderEliminarCertamente precisamos investir mais nos pacientes, mas muito há ainda a se fazer nos que em torno dos doentes estão sempre negligenciados peloa sistema de saúde como familiares, acompanhantes e é claro, profissionais de saúde.
Temos de cuidar melhor de quem cuida dos pacientes.
Renata, parabéns pelo comentário.
ResponderEliminarCuidar de quem cuida não é mera retórica, é uma necessidade.
Afinal, o processo de burnout não apenas se reflete na qualidade de vida dos profissionais de saúde como também na qualidade do cuidado dada aos pacientes.
este artigo é esclarecedor, nos explica a causa do principal mal atual dos profissionais da saude.se os funcionarios fossem diagnosticas precocemente, a assistencia ao cliente, que atualmente é focada de uma forma diferenciada, seria prestada de um a forma mais participativa e elaborada, afinal o profisssional da saude tambem é um cliente, embora deva ser diferenciado.
ResponderEliminargostaqria de saber qual é o tratamento
ResponderEliminarqual será o melhor tratamento para esta síndrome seria psicoterapia?
ResponderEliminarMuito interessante. Infelizmente, nós profissionais da saúde, sabemos que a grande maioria dos estabelecimentos de saúde pouco se importam com a qualidade de vida de seus profissionais, e o pior, não atrelam isso ao fator de produção, ainda permanecem com uma visão colonial de produção e manutenção de custos baixos através da sobrecarga do profissional de saúde e das péssimas condições de trabalho. Mas quem se importa? O importante é fazer "pra inglês ver".
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