Mas o uso de probióticos é isento de riscos ? A administração pode ser prolongada, em conjunto com o uso de medicamentos que levaram ao processo de disbiose ?
Por isso separei 3 artigos recentes que botam estes conceitos em dúvida.
Primeiramente Merenstein e colaboradores fizeram uma revisão muito legal que falam desde a fabricação industrial de probióticos até seu uso clínico. A fabricação deve seguir conceitos de cultura bacteriana e contagem de colônias muito estritas, além de cultivar em meios de cultura para assegurar que as bactérias têm MIC (mínima concentração inibitória) para antimicrobianos e não têm tendência a se tornarem resistentes também. A ideia de repor algumas espécies de bactérias e recompor a microbiota de um indivíduo também é muito frágil: cada pessoa tem uma microbiota diferente da outra, e dar uma receita padrão para uso industrial parece se tornar uma ideia ao mesmo tempo frugal e enganosa. São raras as vezes que se pede um exame de fezes detalhado (análise de RNA ribosossomal procariota ou metagenômica) do paciente para se saber a composição da microbiota naquele momento e verificar as espécies existentes que pode se repor ou inibir. Veja abaixo a complexidade da composição majoritária de microbiota intestinal:
Saikrishna estudou o efeito de probióticos em pacientes na UTI, fazendo exame de fezes com marcação de RNA ribossomal para analisar as mudanças após administração de fórmula de probiótico com espécies de Streptococcus, Lactobacillus e Bifidobacterium ou placebo em grupo controle. Para surpresa de todos, não se encontrou diferença na análise de fezes após 7 dias na diversidade da microbiota dos 2 grupos, nem diferença em taxas de infecções nosocomiais ou tempo de permanência. Um único resultado positivo foi a redução de abundância de algumas bactérias patogênicas no grupo com probiótico.
E Mayer e colegas estudaram mais de 23 mil pacientes de UTI usando cateteres venosos profundos, de maneira retrospectiva. O objetivo era saber se probióticos se associaram com a taxa de infecção de corrente sanguínea. O resultado foi que além de não haver redução desta infecção na população com probiótico, ainda havia um risco de desenvolver bacteremia ou fungemia pelo uso de probiótico, principalmente se a forma de administração era de drágea/pó. O NNH ("number needed to harm") foi de 270, que deve ser considerado. O possível mecanismo (já demonstrado em relatos e séries de casos nos últimos 20 anos) é que se abre a drágea, se coleta o pó com bactérias ou fungos e se dilui em um recipiente para depois se administrar pelo cateter enteral. Neste intervalo se mexe também com o cateter venoso, e o estrago está feito...
Enfim, o uso de probióticos em pacientes graves (que em várias ocasiões também são ou se tornam imunossuprimidos) pode causar efeitos colaterais inesperados e raramente beneficiam os pacientes. "A emenda sai pior que o soneto", como disse o poeta Manuel Maria Barbosa de Bocage.
Enfim, o uso de probióticos em pacientes graves (que em várias ocasiões também são ou se tornam imunossuprimidos) pode causar efeitos colaterais inesperados e raramente beneficiam os pacientes. "A emenda sai pior que o soneto", como disse o poeta Manuel Maria Barbosa de Bocage.
Merenstein et al, "Emerging issues in probiotic safety: 2023 perspectives". Gut Microbes 2023; 15(1): ttps://doi.org/10.1080/19490976.2023.2185034.
Saikrishna K et al, "Study on Effects of Probiotics on Gut Microbiome and Clinical Course in Patients with Critical Care Illnesses". Microbiol Ecol 2023; https://doi.org/10.1007/s00248-023-022248
Mayer et al, Crit Care Med 2023: 10.1097/CCM.0000000000005953, June 01, 2023.
Carvalho LD, disponível em https://virusdaarte.net/a-emenda-saiu-pior-do-que-o-soneto/.
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